Graças
à prisão de quatro executivos de empresas que andaram pescando quilos de
dinheiro às margens do São Francisco, a milagrosa transposição das águas acaba
de transferir-se do cartório onde jaz o Brasil Maravilha para o noticiário
político-policial. Agonizante desde os trabalhos de parto, o que deveria ser a
obra do século é hoje o mais recente esqueleto do acervo acumulado pelo
escândalo do milênio. A extravagância fluvial nem precisou ser inaugurada para
transformar-se num portentoso símbolo da Era da Mediocridade. E numa prova de
que, num momento infeliz da nossa história, o povo brasileiro desempenhou
aplicadamente o papel de otário.
Em
2004, estacionado no Ceará, o palanque ambulante jurou que até 2006 seria
materializado um dos grandes sonhos de Dom Pedro II (ou “Predo”, na pronúncia
do Pedro III de botequim). “Muitas vezes a coisa pública foi tratada no Brasil
como se fosse uma coisa de amigos, um clube de amigos, e não uma coisa pública
de verdade”, ensinou Lula durante a discurseira ufanista. Como o gênio da raça
descobrira que a coisa pública deve ser tratada como coisa pública, sobravam as
verbas que sempre faltaram. “Dinheiro não vai faltar”, gabou-se o maior dos
governantes desde Tomé de Souza.
Na
campanha presidencial de 2006, o aspirante a um segundo mandato não pronunciou
uma única e escassa palavra sobre a multiplicação das águas que continuavam
onde sempre estiveram. A vitória nas urnas refrescou-lhe a memória. Sem
apresentar justificativas para os dois anos de atravo, avisou que ainda faltavam
quatro para que o sertão virasse mar. “Em 2010, um Nordestino pobre vai fazer o
que nem um Imperador conseguiu”, recomeçou a lenga-lenga...
Augusto
Nunes – VEJA
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