domingo, 21 de novembro de 2010

ENTREVISTA: GOVERNADOR IBERÈ FALA A TRIBUNA DO NORTE SOBRE SUA CAMPANHA E TRANSIÇÃO DO GOVERNO

Governador Iberê Ferreira de Souza
Veja a entrevista do Governador Iberê Ferreira:
Ainda que tenha protagonizado a única e maior derrota de sua vida pública durante a eleição para o governo do Estado, este ano, o governador Iberê Ferreira de Souza (PSB) disse que está feliz e sem qualquer tipo de ansiedade. Enfático ao dizer que continuará na vida pública, não declarou nesta entrevista à TRIBUNA DO NORTE o que espera do futuro político. Iberê assinalou que entregará o governo em situação difícil à futura chefe do Executivo, Rosalba Ciarlini, mas garantiu que cumprirá a Lei de Responsabilidade Fiscal. Segundo ele, sua derrota tem um pai só: ele próprio. E, apesar das dificuldades, assegura que não há risco de atraso nos salários de novembro, dezembro e décimo terceiro dos servidores estaduais. Para 2012, aposta em Wilma de Faria como nome mais forte para a Prefeitura de Natal.
Como é que a governadora eleita Rosalba Ciarlini vai receber o Executivo Estadual?
A governadora vai encontrar o governo com algumas dificuldades de ordem financeira, mas um estado com algumas obras importantes, estruturantes que estão sendo iniciadas e que ela vai tocar. Ela vai receber um valor aproximado de dois bilhões em obras entre contratadas e licitadas. Algumas estão iniciadas, como por exemplo a do prolongamento da Prudente de Moraes. Eu considero essa uma obra importantíssima e fundamental para o desenvolvimento do Estado. Até dezembro nós vamos deixar esse prolongamento chegando à BR, mas em seis meses é que o governo vai concluir a estrutura, porque tem ainda o viaduto que ainda vai ser feito. Nós temos também a barragem de Oiticica, que é uma obra que foi licitada agora e que está no PAC 2 [Programa de Aceleração do Crescimento] e vai ser praticamente iniciada por ela. Pode ser até que a ordem de serviço seja dada por nós. Essa é uma obra de 240 milhões de reais. É importante do ponto de vista da região do Seridó, do ponto de vista dos recursos hídricos, porque há uma carência e nós vamos depender menos da Paraíba, já que a água vem de lá. E ela vai ter uma dupla função, vai servir como barragem de contenção de cheias e reguladora. Vai trabalhar com a [barragem] Armando Ribeiro Gonçalves para evitar as cheias do rio Açu.
Do ponto de vista financeiro qual o grau de preocupação?
Há preocupações assim como todos os estados, sobretudo os menores do Nordeste. É por isso que hoje você chega em qualquer fórum e os prefeitos e governadores pedem logo a reforma tributária para que haja uma distribuição mais justa com os estados e municípios. Os municípios estão de pires na mão. Essa nossa dificuldade financeira não nasceu agora. Ela vem desde 2008 com a crise mundial e ultrapassou 2009. A partir daí, nós tivemos uma diminuição da receita de mais de 400 milhões de reais. Hoje nós temos o FPE [Fundo de Participação dos Estados], que é praticamente a receita mais importante junto com o ICMS. A previsão dele [do FPE] para este ano foi em função de 2008, então nós vamos chegar a dezembro com 182 milhões a menos do FPE. Por outro lado, no caso dos royalties vamos ter esse ano 32 milhões a menos do que foi a previsão dos royalties de 2009, isso em função do dólar e também levando em consideração que o petróleo tem momento em que a produção está aumentando, mas agora nós estamos em um momento em que a produção diminuiu. Agora está havendo um trabalho e a Petrobrás. Está reiniciando uns trabalhos fortes para a recuperação da nossa produção. Nós fizemos também o Plano de Cargos e Salários, que foram todos eles cumpridos. Isso requer recursos. Tudo que foi aprovado pela Assembleia nós implantamos. Isso significou mais 52 milhões de reais a mais nesses últimos três meses. Mas nós vamos pagar. Por exemplo, na Saúde, tivemos até setembro 42 milhões de ordens judiciais que foram cumpridas, sem que tivéssemos orçamento. São esses tratamentos que as pessoas vão à Justiça que manda fazer e pagar os medicamentos. Fora mais 20 milhões de ordem judicial para pessoal. Então são essas dificuldades que estamos colocando. Do ano passado para cá, quando a ex-governadora [Wilma de Faria] teve essa diminuição de receita, nós tivemos 150 milhões de restos a pagar e pagamos tudo. A nossa dificuldade financeira nesse momento é da ordem de 150 a 200 milhões de reais e nós estamos lutando para ver como conseguimos sanar isso aí.
Embora tenha sido constatada uma variação aquém com relação ao FPE e royalties, pôde-se notar, ainda assim, que a arrecadação cresceu. Essa dificuldade de ordem financeira, então, não pode ser também face o inchaço da máquina, sobretudo com relação ao custeio?
Mas ela já vem pesada há muito tempo. Você não pode culpar um só governante. A burocracia da máquina emperrada já vem se agravando a cada ano. A minha ideia era exatamente fazer uma reforma administrativa logo no início do meu governo, se eu tivesse vencido a eleição. Na realidade paga-se mal, o funcionalismo ganha pouco, fica desestimulado, e você termina com muita gente... E como paga mal acaba tendo que dar gratificação. Aí lá vem penduricalhos. Muitas coisas foram corrigidas agora com os planos de cargos e salários em diversas categorias.
O senhor acredita, diante dessa crise, que será inevitável deixar dívidas para o próximo governo?
A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) não permite e daí a dificuldade que nós estamos passando, que não podemos deixar restos a pagar. A não ser que tenha recursos empenhados para pagar, como é o caso de energia, combustível, telefone e contas gerais do mês de dezembro. Pode deixar restos a pagar mas com dinheiro garantido. Essa é que é a grande dificuldade. E eu tenho que cumprir a LRF e eu vou cumprir porque eu perdi a eleição, mas não perdi o senso de minha responsabilidade.
Em meio a essa crise financeira, o funcionalismo público estadual deve se preocupar com a possibilidade de atraso dos salários, por exemplo?
Salário é minha prioridade. Quanto a isso aí eu posso tranquilizar os servidores. Vou pagar novembro, dezembro e o décimo terceiro. E vou pagar com todos os reajustes que foram acertados.
Quais as principais medidas que foram adotadas para enxugar os gastos da máquina?
Nós demos um arrocho no custeio enorme. Nós diminuímos do custeio coisas pequenas, que aparentemente são pequenas, mas meu pai já dizia que nós temos que nos preocuparmos com essas despesas. As grandes despesas normalmente você conversa, raciocina e vê como vai ser. Mas as pequenas que são perigosas, porque vão se juntando e a soma delas as vezes fica muito maior. Então nós tomamos umas medidas, que eu reconheço que são antipáticas, mas não tinha como deixar de tomar. Diminuímos os telefones celulares, a cota desses telefones. Hoje o funcionário só consegue falar pelo celular com um outro funcionário. A diminuição do número de carros alugados... Nós entregamos muitos desses veículos. Diminuímos a cota do combustível, diárias, entre outras coisas. As diárias acabaram funcionando como moeda para suprir salários e nós demos um aperto nisso aí. Agora mesmo no Carnatal eu cancelei o camarote do governo. Me disseram que o valor era pouco e que eu ia gastar somente 150 mil. Mas eu analisei e pensei que 150 com 150 faz 300 e daqui a pouco a despesa é de 1 milhão. Então eu estou fazendo essa economia que muita gente não gosta, mas não tenho outra solução. Evidente que eu estou também tentando algum recurso do governo federal, sobretudo para compensar essas perdas que nós estamos tendo.
O tempo que o senhor ficou no mandato foi suficiente para realizar uma gestão pela qual se sinta satisfeito?
Foi não. Mas eu estou muito feliz e realizado com o pouco que eu pude fazer. Eu tenho consciência de que fiz o que era possível. Quando eu comecei o governo tava com umas ideias, mas a onze dias de tomar posse fui surpreendido por um câncer no pulmão. Eu tive que me operar, fazer radioterapia, quimioterapia. Então embora eu não me arrependa do que fiz, porque graças a Deus deu tudo certo, eu não tenho a menor dúvida de que perdi a agilidade nas ações que eu ia executar. Mas na área de Segurança nós conseguimos, assim como recursos humanos, algum sucesso. Hoje, você pode ir à polícia. Nós primeiro fizemos o concurso, o treinamento da Polícia Civil, delegados, escrivães, e são 510 que estão terminando agora e vão ser nomeados. Eu trouxe muitos policiais que estavam em desvio de função. Aumentamos o efetivo da Polícia Militar em 40% e colocamos a Polícia mais efetivamente nas ruas. Além disso, compramos viaturas maiores. Se fala da impunidade, mas você veja que ultimamente a polícia tem prendido os assaltantes. Em Monte Alegre recentemente houve uma tentativa de assalto mas não houve roubo. No absurdo que ocorreu com [o jornalista assassinado] F. Gomes, o criminoso em 24 horas estava preso e agora continuam as investigações do caso. Aumentamos o número de apreensão de drogas, diminuímos o número de homicídios. Natal hoje só perde para uma capital do Brasil na lista das menos violentas. Então nós agimos diretamente na Polícia. Não houve até hoje na história um governante que fizesse mais promoção na Polícia do RN do que nós fizemos. Isso significa autoestima. Na Segurança Pública nós colocamos essas câmeras de monitoramento que têm dado resultado. Criamos os três comandos do interior, quando somente existia um só em Natal. E vamos inaugurar agora em novembro o prédio definitivo da Secretaria de Segurança que hoje está dividido em oito ou nove casas. Agora tinha muita coisa que nós queríamos fazer e que não houve tempo – doença, campanha e fim de governo.
Qual a avaliação que o senhor faz da campanha?
Eu começo dizendo o seguinte: normalmente a derrota é órfã e a vitória tem muitos pais. Eu nessa minha campanha tenho dito exatamente o contrário: a derrota tem um pai. Sou o pai e o responsável.
O senhor aponta algum equívoco específico na formação de aliança, falta de empenho de aliado ou estratégia errada?
Não. Nós perdemos porque não tivemos os votos que dessem para ganhar. Mas eu acho que o que foi possível foi feito, temos algumas falhas sim, as quais devemos evidentemente avaliar. Mas não para lamentar e sim para tentar evitar em outros embates. Agora por exemplo, a aliança que foi feita com João Maia (PR) e Henrique Alves (PMDB), acho que não foi boa para nós. Mas em compensação não tenho nada a reclamar de nenhum dos meus aliados que estavam nessa aliança. João Maia, pelo contrário, foi uma pessoa que vestiu a camisa e trabalhou e Henrique Eduardo fez o que pôde. Agora evidente que Henrique tinha alguns problemas. Nós tínhamos uma coligação com dois candidatos ao Senado mas ele, apesar de votar em mim, votava no senador Garibaldi. Então a presença de Henrique... E ele me falou do constrangimento, embora tenha razão da posição que tomou. Não tem essa história de corpo mole, absolutamente. Eu acho que demoramos na escolha do vice. Isso não foi bom, mas essa demora já foi em função da limitação que ficamos em relação aos nomes. Na hora em que o PR, aliado importante, se juntou com PMDB, nós ficamos sem eles. Ficamos limitados ao próprio partido e ao PT. Agora eu não tenho nenhum ressentimento, ódio, arrependimento. Eu estou muito feliz e aproveito essa oportunidade para agradecer a todos que colaboraram com minha luta, aos que votaram em mim, mais de meio milhão de pessoas.
O senhor e a ex-governadora Wilma estarão sem mandato a partir de 2011. Por outro lado, o seu partido é aliado de primeira hora da presidenta eleita Dilma Rousseff. Qual o papel da legenda em 2011?
A maior preocupação do PSB em nível nacional é o de dar sustentação ao governo Dilma. Eu já escutei isso do nosso presidente, [governador reeleito de Pernambuco] Eduardo Campos. O PSB foi um partido vitorioso dessa campanha. Nós fizemos seis governadores, inclusive com o senador Casagrande, do Espírito Santo, o que nos dá representatividade em praticamente todas as regiões do país. O governador Eduardo Campos tem dito que espera que o partido possa participar do governo, mas ele disse claramente que o governo é da presidenta Dilma. Ela que vai chegar em determinado momento e dizer ao governador se tem um espaço, qual o espaço e o perfil a ser indicado. Mas essa história de ficar perguntando por cargos e outras coisas não é o estilo do governador Eduardo Campos e nem do PSB.
Como o senhor pensa o seu futuro político?
A idade tem coisas muito boas. E uma das boas é que nós perdemos a ansiedade. Eu estou focado em terminar o governo dentro da legalidade. Eu quero facilitar no que for possível a transição para que o novo governo não perca muito tempo tomando pé da situação. Afinal de contas eu vou continuar morando aqui. Eu não sou daqueles que quanto pior melhor. Eu desejo sucesso à governadora. Agora, vou fazer oposição, não raivosa e nem radical, mas com responsabilidade. Eu tenho dito sempre que não se faz política somente com mandato.
O senhor pensa em transferir o domicílio eleitoral para Natal para disputar a prefeitura?
Não estou pensando nisso. Eu acho que nós temos uma missão muito importante em Natal que é manter o grupo unido. Nós tivemos aí um candidato a governador que foi Carlos Eduardo, que foi prefeito e é muito bem avaliado e que é da base de sustentação do governo Lula. Nós precisamos manter essa aliança. Agora eu digo sempre o seguinte: eu sou dou uma palavra sobre a prefeitura de Natal depois que a ex-governadora se decidir. Se ela disser que é candidata, eu voto nela. Ela não decidindo, nós vamos ver e aglutinar o maior número de aliados.
O senhor se coloca entre os nomes disponíveis nessa discussão sobre a eleição de 2012 em Natal?
Eu sou político. E vou continuar na vida pública, então eu não posso me alijar. Mas eu não estou determinado para isso. Estou determinado para que possamos montar um grupo que possa vencer a eleição. Eleição é soma. Nós temos que juntar tudo que for possível, inclusive os cacos da derrota.
Por Aldemar Freire e Maria da Guia Dantas

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