Joel Germano deixou sua cidade, Santa Maria, localizada a 57 quilômetros de Natal, por volta das 6h da manhã do último dia 06/04/2010. Saiu para resolver alguns assuntos particulares e às 9h estava na fila do Detran-RN, no bairro Cidade da Esperança, em Natal.
A falta de informação é algo crônico no Detran; os marinheiros de primeira vaigem ficam perdidos. Foto Alex Régis.Marceneiro que trabalha por conta própria, Joel adiou alguns negócios para poder passar um carro Gol, ano 2000, parMarceneiro que trabalha a o seu nome, após várias parcelas pagas junto ao banco. O que Joel Germano, de 40 anos, não sabia, é que um processo corriqueiro na sede do Detran é um teste de paciência sem tamanho. Resultado: após mais de cinco horas e oito filas, Joel conseguiu seguir de volta para Santa Maria.
A reportagem da TRIBUNA DO NORTE acompanhou de perto, sem ser identificada, a dificuldade e a demora para se conseguir resolver uma pendência simples na burocracia do Departamento Estadual de Trânsito. O caso de Joel serve de exemplo, com um detalhe, muitos companheiros de fila do marceneiro o avaliaram como sortudo. Motivo? Naquela manhã, 06 de abril, havia pessoas que já estavam no segundo ou terceiro dia de tentativa. A demora é rotina para qualquer cidadão comum que precise resolver uma pendência no órgão e não esteja disposto a pagar um despachante, figura credenciada pelo Detran e que tem ‘facilidades’ na hora do atendimento. As razões para tamanha demora passam pela burocracia e pela falta de estrutura do Detran/RN.
Mas voltemos para o caso de Joel. São 9h da manhã e ele chega com o carro na fila da vistoria. Esse é o primeiro passo dentro da instituição, mas não o primeiro da interminável fila burocrática. Antes de ir ao Detran, Joel Germano teve que contactar a loja que vendeu o carro e pedir à financeira um documento atestando que o valor havia sido quitado. Com toda essa papelada em mãos, ele vai até o Detran. Na primeira fila, Joel espera durante 20 minutos até que todos os carros passem pela vistoria.
Tempo decorrido, chega a vez do marceneiro. Mas não é agora que a vistoria será feita. É preciso antes pegar mais uma fila, logo ao lado, para adquirir o “laudo”, ou seja, o formulário que será usado pelo perito. A fila não está lá muito extensa, ainda, e por isso perdemos apenas dez minutos na espera. É bom ressalvar que em nenhum momento fomos informados da necessidade de pegar essa fila, o que pouparia um bom tempo para todos. Aliás, a falta de informação é algo crônico ali. Não é raro observar marinheiros de primeira viagem perdidos, à procura de uma orientação.
Mas vamos à vistoria. Um rapaz aparentando cerca de 20 anos, se muito, chega até o veículo e começa a examiná-lo. Problema. O extintor de incêndio está com o prazo de validade vencido. Contudo, isso não é motivo para recomeçar o processo. O estagiário que nos atende avisa que há um vendedor de extintores de incêndio logo na calçada do Detran, na parte de trás do prédio. Sem ter o que fazer, vamos até lá. O homem, com uma banca cheia de extintores armada, avisa que o equipamento custará R$ 20. Quantia paga e o problema está resolvido. Depois disso, o exame do carro em si não dura nem 10 minutos. No final, o estagiário chega até um perito encostado numa pilastra e perdido num bom papo furado. O perito assina o papel sem nem ver e o estagiário entrega o papel para Joel Germano. Próximo passo.
Com o laudo em mãos, é preciso pegar novamente a fila onde o formulário foi distribuído. Aqui já se passou uma hora inteira e o número de pessoas à espera não é mais tão pequeno. Chega a doer aguardar até que todos sejam atendidos. Essa parte do processo durou 40 minutos. Quase 40 vezes mais do que o tempo necessário para que o funcionário do Detran assine e valide o procedimento. Passada uma hora e meia, quando pensamos que tudo está perto do fim, é aqui que o processo se inicia. Literalmente. A próxima fila é para dar entrada no “processo em si”. Uma funcionária – também estagiária – faz a triagem das demandas. O usuário ganha uma pasta e pega mais uma fila, a quinta fila da manhã. Joel espera por 35 minutos na quinta fila. Já havia sido gastos mais 15 minutos na triagem, o que soma 50 minutos.
O nosso personagem não teve sorte nesse momento. Um documento do cartório não constava da papelada (são quase dez documentos até aqui, entre xerox e originais). Dessa forma, vamos até o 5º. Ofício, no bairro do Alecrim, e ao retornarmos, Joel consegue agilizar tudo. Falta apenas pagar e receber o documento em seu nome. Contudo, o “apenas” não é “apenas”. Existe somente um caixa para atender a toda demanda da sede do Detran. Como passam centenas de pessoas todos os dias por ali, não é de se estranhar o tamanho da fila. Essa é a parte, sem dúvida, mais cansativa, até porque passa do meio dia. Todos estão com fome, inclusive a funcionária do Banco do Brasil. Os ânimos aqui se exaltam e alguns usuários chegam a fiscalizar na boca do caixa o movimento, com medo dos fura-filas. Os despachantes são hostilizados por conseguiram furar a espera e agilizar o trâmite dos pagamentos.
“Não há o que mudar, é igual em todo lugar”
O Diretor-Geral do Detran/RN, Carlos Theodorico de Carvalho, admite a falta de estrutura do órgão para receber o público de maneira devida. Contudo, faz um ressalva quanto à burocracia. Independente de ser um excesso – e o Diretor não entrou nesse mérito – os processos do Rio Grande do Norte seguem as regras, segundo ele, do Conselho Nacional de Trânsito. Não há o que mudar. “É igual em todo e qualquer estado”, sentencia.
No que diz respeito à agilidade da máquina, Carlos Theodorico concorda que falta pessoal para realizar um atendimento digno. E a evidência maior está na própria porta de entrada. “Temos estagiários fazendo vistoria porque sem eles seria bem pior. Eles são bem treinados, escolhemos bem, mas é claro que é preciso ter peritos do quadro nesse trabalho”, afirma. O último concurso para o Detran foi realizado na década de 1970 e hoje são 290 funcionários do quadro para cuidar de 700 mil veículos na frota. Em outras palavras, é humanamente impossível. Um exemplo é quantidade de pessoal nos guichês de atendimento. Enquanto Joel esperava, haviam três funcionários atendendo e quatro guichês vazios. “Recebemos a confirmação do concurso que será este ano e com isso certamente esse problema terá uma melhora. Não será resolvido, mas irá melhorar”, encerra o diretor.
Tribuna do Norte – Por Isaac Lira – Repórter
A reportagem da TRIBUNA DO NORTE acompanhou de perto, sem ser identificada, a dificuldade e a demora para se conseguir resolver uma pendência simples na burocracia do Departamento Estadual de Trânsito. O caso de Joel serve de exemplo, com um detalhe, muitos companheiros de fila do marceneiro o avaliaram como sortudo. Motivo? Naquela manhã, 06 de abril, havia pessoas que já estavam no segundo ou terceiro dia de tentativa. A demora é rotina para qualquer cidadão comum que precise resolver uma pendência no órgão e não esteja disposto a pagar um despachante, figura credenciada pelo Detran e que tem ‘facilidades’ na hora do atendimento. As razões para tamanha demora passam pela burocracia e pela falta de estrutura do Detran/RN.
Mas voltemos para o caso de Joel. São 9h da manhã e ele chega com o carro na fila da vistoria. Esse é o primeiro passo dentro da instituição, mas não o primeiro da interminável fila burocrática. Antes de ir ao Detran, Joel Germano teve que contactar a loja que vendeu o carro e pedir à financeira um documento atestando que o valor havia sido quitado. Com toda essa papelada em mãos, ele vai até o Detran. Na primeira fila, Joel espera durante 20 minutos até que todos os carros passem pela vistoria.
Tempo decorrido, chega a vez do marceneiro. Mas não é agora que a vistoria será feita. É preciso antes pegar mais uma fila, logo ao lado, para adquirir o “laudo”, ou seja, o formulário que será usado pelo perito. A fila não está lá muito extensa, ainda, e por isso perdemos apenas dez minutos na espera. É bom ressalvar que em nenhum momento fomos informados da necessidade de pegar essa fila, o que pouparia um bom tempo para todos. Aliás, a falta de informação é algo crônico ali. Não é raro observar marinheiros de primeira viagem perdidos, à procura de uma orientação.
Mas vamos à vistoria. Um rapaz aparentando cerca de 20 anos, se muito, chega até o veículo e começa a examiná-lo. Problema. O extintor de incêndio está com o prazo de validade vencido. Contudo, isso não é motivo para recomeçar o processo. O estagiário que nos atende avisa que há um vendedor de extintores de incêndio logo na calçada do Detran, na parte de trás do prédio. Sem ter o que fazer, vamos até lá. O homem, com uma banca cheia de extintores armada, avisa que o equipamento custará R$ 20. Quantia paga e o problema está resolvido. Depois disso, o exame do carro em si não dura nem 10 minutos. No final, o estagiário chega até um perito encostado numa pilastra e perdido num bom papo furado. O perito assina o papel sem nem ver e o estagiário entrega o papel para Joel Germano. Próximo passo.
Com o laudo em mãos, é preciso pegar novamente a fila onde o formulário foi distribuído. Aqui já se passou uma hora inteira e o número de pessoas à espera não é mais tão pequeno. Chega a doer aguardar até que todos sejam atendidos. Essa parte do processo durou 40 minutos. Quase 40 vezes mais do que o tempo necessário para que o funcionário do Detran assine e valide o procedimento. Passada uma hora e meia, quando pensamos que tudo está perto do fim, é aqui que o processo se inicia. Literalmente. A próxima fila é para dar entrada no “processo em si”. Uma funcionária – também estagiária – faz a triagem das demandas. O usuário ganha uma pasta e pega mais uma fila, a quinta fila da manhã. Joel espera por 35 minutos na quinta fila. Já havia sido gastos mais 15 minutos na triagem, o que soma 50 minutos.
O nosso personagem não teve sorte nesse momento. Um documento do cartório não constava da papelada (são quase dez documentos até aqui, entre xerox e originais). Dessa forma, vamos até o 5º. Ofício, no bairro do Alecrim, e ao retornarmos, Joel consegue agilizar tudo. Falta apenas pagar e receber o documento em seu nome. Contudo, o “apenas” não é “apenas”. Existe somente um caixa para atender a toda demanda da sede do Detran. Como passam centenas de pessoas todos os dias por ali, não é de se estranhar o tamanho da fila. Essa é a parte, sem dúvida, mais cansativa, até porque passa do meio dia. Todos estão com fome, inclusive a funcionária do Banco do Brasil. Os ânimos aqui se exaltam e alguns usuários chegam a fiscalizar na boca do caixa o movimento, com medo dos fura-filas. Os despachantes são hostilizados por conseguiram furar a espera e agilizar o trâmite dos pagamentos.
“Não há o que mudar, é igual em todo lugar”
O Diretor-Geral do Detran/RN, Carlos Theodorico de Carvalho, admite a falta de estrutura do órgão para receber o público de maneira devida. Contudo, faz um ressalva quanto à burocracia. Independente de ser um excesso – e o Diretor não entrou nesse mérito – os processos do Rio Grande do Norte seguem as regras, segundo ele, do Conselho Nacional de Trânsito. Não há o que mudar. “É igual em todo e qualquer estado”, sentencia.
No que diz respeito à agilidade da máquina, Carlos Theodorico concorda que falta pessoal para realizar um atendimento digno. E a evidência maior está na própria porta de entrada. “Temos estagiários fazendo vistoria porque sem eles seria bem pior. Eles são bem treinados, escolhemos bem, mas é claro que é preciso ter peritos do quadro nesse trabalho”, afirma. O último concurso para o Detran foi realizado na década de 1970 e hoje são 290 funcionários do quadro para cuidar de 700 mil veículos na frota. Em outras palavras, é humanamente impossível. Um exemplo é quantidade de pessoal nos guichês de atendimento. Enquanto Joel esperava, haviam três funcionários atendendo e quatro guichês vazios. “Recebemos a confirmação do concurso que será este ano e com isso certamente esse problema terá uma melhora. Não será resolvido, mas irá melhorar”, encerra o diretor.
Tribuna do Norte – Por Isaac Lira – Repórter
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